terça-feira, 12 de novembro de 2013

Calou-se o canto da vida

Os olhos da pampa (histórias gaúchas)

Calou-se o canto da vida

Sabiá, sem bem saber por que, não cantou mais. Talvez, assim como eu, sente tua falta. Sem seu canto, e teu encanto, ficaram tristes e silentes as manhãs, já não se ouve a sua flauta... E eu, que só sabia assobiar tua canção... Desde então calamos, eu e o sabiá...
“Sabiá, triste flautista, desiludiu de ser artista”.

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Até mesmo o Bem-te-vi, que encantava a tua chegada, por não ver-te mais por aqui, foi cantar noutra morada. E eu, que quando bem te vi, me senti um passarinho... De repente a solidão no meu peito fez seu ninho... E nunca mais eu bem te vi, nem a ti nem ao Bem-te-vi...
“Bem-te-vi não te viu mais, e eu nunca mais bem te vi”.

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João-de-barro, meu vizinho, também perdido da companheira, deixou seu rancho sozinho e foi morar noutra porteira... E eu que, feito ele, ergui do barro minha morada... Que tristeza, ele bem sabe, ver o amor deixar a casa...
“Quando o amor bate asas, se faz tapera a casa”.

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Beija-flor, por desamor, nunca mais fez outro ninho e nem foi mais de flor em flor, ferido à ponta de espinho. Desde quando foste embora, falta a mais bela da flora...
“Sou Girassol sem sol, Beija-flor sem flor”.

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Os quero-queros, posteiros, de tanto te querer bem, foram pra outros potreiros pra não querer mais ninguém. E tudo em volta entristeceu depois da tua partida... O pago emudeceu, calou-se o canto da vida.
“Quero-quero, sem querer, também quis meu bem-querer. E tu? Ah, e tu! Tu, mal-me-queres”.


(Danilo Kuhn)